Neste mês de Maio temos à disposição dois registos opostos de uma mesma realidade: o Portugal de 1958, atravessado pelas eleições presidenciais onde Humberto Delgado, candidato não oficial, ousou desafiar o regime.
Falo da biografia de Humberto Delgado, trazida a lume pelo seu neto Frederico Delgado Rosa, um espantoso trabalho de investigação que narra a par e passo a sua vida e se lê agradavelmente. Mas que só foi possível, claro, depois de uma recolha exaustiva de fontes.
Do outro lado do Portugal de 1958, está o Movimento Nacional das Mulheres Portuguesas, que Inês de Medeiros revela no seu documentário Cartas a uma ditadura, e cuja narração podem ler no Luís Galego, que o faz melhor que eu. Mas direi só umas palavras.
Resposta de um regime que se considera ameaçado, o documentário mostra um outro lado desse Portugal longínquo, revisitando essas senhoras que, em 1958, respondem à chamada.
Um documentário tranquilo, muito bem concebido e filmado, que permite ter uma visão de uma outra realidade, e que, mesmo desse lado do Portugal de 1958, apresentada vários registos.
Curiosamente, a maioria das senhoras entrevistadas não consegue definir Ditadura, mas também não o faz para Democracia, em registos de várias classes sociais. Aqui está uma questão que, em meu entender, devia merecer alguma reflexão.
Falo da biografia de Humberto Delgado, trazida a lume pelo seu neto Frederico Delgado Rosa, um espantoso trabalho de investigação que narra a par e passo a sua vida e se lê agradavelmente. Mas que só foi possível, claro, depois de uma recolha exaustiva de fontes.
Do outro lado do Portugal de 1958, está o Movimento Nacional das Mulheres Portuguesas, que Inês de Medeiros revela no seu documentário Cartas a uma ditadura, e cuja narração podem ler no Luís Galego, que o faz melhor que eu. Mas direi só umas palavras.
Resposta de um regime que se considera ameaçado, o documentário mostra um outro lado desse Portugal longínquo, revisitando essas senhoras que, em 1958, respondem à chamada.
Um documentário tranquilo, muito bem concebido e filmado, que permite ter uma visão de uma outra realidade, e que, mesmo desse lado do Portugal de 1958, apresentada vários registos.
Curiosamente, a maioria das senhoras entrevistadas não consegue definir Ditadura, mas também não o faz para Democracia, em registos de várias classes sociais. Aqui está uma questão que, em meu entender, devia merecer alguma reflexão.
14 comentários:
Querida Amiga
É a primeira vez que a comento, segundo creio, embora me pareça já ter lido comentário seu no meu blogue.
Quanto ao seu post, comentá-lo-ei amanhã. O Jorge, do Sino da Aldeia, nosso comum amigo, em boa hora ma recomendou. Estas eleições fazem este ano 50 anos e de tal maneira abalaram a ditadura do Estado Novo que Salazar alterou imediatamente a Lei eleitoral nomeando um colégio para, a partir daí, eleger o presidente.
Continuarei amanhã.
Um beijinho e boa noite.
Ainda não tinha nascido nessa altura, mas o "obviamente, demito-o!" é frase que perdurou muito para além da vivência do general Sem Medo.
Povo sem "memória", é só para alguns... ;)
Jinhos, Leonor!
Querida Leonor
Tinha 17 anos e estava a terminar o sétimo ano no Lyceu Camões, como se pode ler no frontespício. As ideias ainda fervilhavam em turbilhão no meu bestunto.
Um Amigo tinha-me levado à sede da candidatura do Dr. Arlindo Vicente. Ali me apercebi que era um Homem sério, honesto e vertical. Tive a oportunidade de falar durante uns escssos momentos com ele. Havia mais cidadãos e, por isso, em boa verdade, não posso dizer que foi uma conversa em particular.
Alindo Vicente disse então para os que o ouviam que iria até às urnas. Mas, uns dias depois, afirmou que não hesitava em abdicar dessa promessa e resolveu, ouvidos os seus companheiros de luta, estabelecer negociações que levaram à assinatura de um «Pacto» pelo qual se determinava que «as candidaturas passariam a trabalhar em conjunto e seriam representadas nas urnas pelo general Humberto Delgado, obrigando-se este a tornar efectivo o exercício de voto».
Segui com a atenção de adolescente entusiasmado o que se passava. As discussões para um entendimento tiveram lugar em Almada, no dia 30 de Maio de 1958. Nessa noite, o documento foi, em casa de Humberto Delgado, reduzido a escrito e assinado. Aí não estive.
A ditadura salazarenta teve de encarar esse acordo, difícil de engolir pela situação. Daí o terem-lhe chamado, depreciativa e injuriosamente, o «Pacto de Cacilhas». Dali vinha burros para transportar mercadorias, sobretudo peixe. A partir daí, passei-me também com a minha paupérrima cultura pseudo-política para os que apoiavam Delgado.
Com ele tive, também, o privilégio de falar, dois dias depois do seu comício justamente no ginásio do Camões, que haveria de meter polícia de capacete e espingarda e, até, tanques nas ruas. Da Duque de Loulé à praça José Fontana, houve cargas sobre os oposicionistas que tiveram de fugir.
Eu, depois de ter levado umas coronhadas nas costas, consegui escapulir-me e esconder-me numa casa de banho das Senhoras, no Monte Carlo, ali ao Saldanha, no edifício do cinema Monumental.
Tive, pois, o privilégio de ouvir o General Sem Medo e de lhe colocar duas perguntas sobre as suas ideias para trazer a Liberdade e a Democracia para Portugal.
Hoje, recordando o que me afirmou, tenho de reconhecer com a equidade, o realismo e a isenção possíveis, que o Humberto Delgado que me tornou eufórico - sabia muito pouco de política. Valente era, asseguro. Mas a sua preparação resultava sobretudo dos anos que passara nos Estados Unidos como Adido Militar.
Depois, bom, depois, foi a via sacra que o General percorreu, desde a Embaixada do Brasil, que lhe deu guarida, medeando um largo tempo com aventuras mirambolantes, até mesmo delirantes, tendo passado por Argel, onde não se eximiu de ter mais um conflito complicado.
Dir-me-ia, já depois do 25 de Abril, Fernando Piteira Santos, que então ali se tinha exilado, que ficara com uma má impressão da dita «cultura políca» do Oficial da Força Aérea.
Mas para sempre me ficou gravado no cérebro a famosa entrevista realizada pelo jornalista Mário Neves em 10 de Maio de 1958 no café Chave de Ouro, quando lhe foi perguntado que postura tomaria face ao Presidente do Conselho, António de Oliveira Salazar, respondeu com a célebre frase “obviamente, demito-o”. Eu estava lá - e ouvi. Foi a frase de declaração de guerra ao regime.
Ela incendiou os espíritos das pessoas oprimidas pelo regime salazarista que o apoiaram e o aclamaram durante a campanha.
Como é sabido, acabou por ser derrotado graças à gigantesca fraude eleitoral montada pelo regime.
Diz-se que estando desiludido com os sucessivos fracassos políticos, (o episódio do Quartel de Beja avultando entre eles) procurou reconciliar-se com Salazar, que por fim o convocou.
Ao seu encontro, na fronteira Espanhola em Villanueva del Fresno (Espanha, nos arredores de Olivença), foi enviado um comando da PIDE, liderado por Rosa Casaco e que ainda integrava Casimiro Monteiro, que o assassinou a tiro, bem como à sua secretária Ajairir de Campos. Morreu assim na fronteira, sem ter conseguido regressar a Portugal, no dia 13 de Fevereiro de 1965
Vão cinquenta anos sobre estes acontecimentos, o que quer dizer que estou velhíssimo, a caminho dos 67 anos. Qualquer dia, tenho de ter duas canadianas. Porém, a minha mulher Raquel, responde-me, perante Amigos: «com dezoito aninhos cada uma, por derto. Mas tu já não sabes o que fazer com elas...» Maldade pura, vilipêndio, ironia mordaz, diria até assassina. Mas sou perfeitamente capaz de reproduzir tim-tim-por-tim-tim o que presenciei, o que ouvi e o que vi. Estou, pois, de alma e comemoração com as comemorações do cinquentenário das eleições roubadas a Humberto Delgado.
Já roubei espaço e tempo à minha querida Leonor, que é bué de fixe. Baso por aqui. Desculpem-me este escrito maior do que a légua da Póvoa. Mas, que querem, estas coisas vividas foram de tal modo um privilégio que permanecem intactas na minha memória. Se fosse a escrever tudo - nem um tratado em 42 volumes com XII Anexos, Quadros Auxiliares e Indíce Remissivo chegariam. Além de que eu não seria tipo para o fazer, olarila.
Um dos maiores heróis portugueses, dos poucos que enfrentou abertamente o Estado Novo, e pagou com a vida por isso.
Um beijo!
E realmente merece reflexão. Gosta de blogs dissecáveis. Já estive aqui antes. mas vc me desprezou. Mas não a esqueci.
Visite o meu blog:
wwwrenatacordeiro.blogspot.com/
não há ponto depois de www
Conto com a sua visita,
Renata Cordeiro
Sou aquela cujo livro a Martha Maders Corrêa Barbosa pôs no seu blog.
Já comentei o post do Luis há uns dias.
Não vivi estes tempos mas admiro gente que dá a vida pelos ideais que defende.
Beijinhos e bom fim-de-semana
Sophiamar
Esteja à vontade, venha quando poder e tiver tempo, também sei o que isso é, e sim, já me viu por lá.
Já tinha lido qualquer coisa sobre o documentário, mas não tinha feito a ligação às eleiçºões de 1958, foi extremamente interessante vê-lo, vale imenso a pena.
beijinhos
Teté
Claro que essa frase é uma marca que ficou, mas realmente tenho pena que a memória da nossa história recente ainda seja vivida nalguns casos como se duas histórias se tratasse.
beijos
Caro Henrique
Não tendo vivido nesses tempos, claro, sempre achei a postura do General Humberto Delgado bastante interessante naquele ano de eleições. Que as eleições foram viciadas também não era novidade para mim, já que me lembro de ouvir o meu avô materno dizer que se tinha dado ao trabalho dce estar todo o dia à frente do sítio onde se votava a contar as pessoas que entraram e que quendo sairam os resultados havia mais votos que pessoas ...
ficar "preso" a um acontecimento às vezes pode ser injusto para a pessoas, creio eu.
tem tanats memórias, porque não as passa a letra de forma?
beijinhos
Rafeiro
É, perdeu a vida, mas não deixou de marcar um virar na nossa história.
A biografia, que está muito bem feita, é uma justa homenagem
bom fim de semana
Renata
Ainda bem que voltou e gosta e já agora percebeu a minha preocupação.
Mas não a desprezei, nunca o faço. Acontece apenas que, para blogs novos, posso demorar mais tempo a fazer a visita porque gosto de a fazer com tepo... que é coisa que não tem abundado por aqui.
Mas vou tratar de resolver a questão.
Aquela referência à Martha está-me a confundirr...
beijos
Blue
eu sei, já tinha lido
beijinhos, bom fim de semana
Muito curioso o facto das definições de "ditadura" e de "democracia" serem tão titubeantes e imprecisas.
Algo realmente para se reflectir!
Jorge
É, não é?
E isso tanto para as Senhoras que perderam como para as que ganharam com o 25 de Abril...
Boa semana
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