domingo, 29 de junho de 2008

O Paraíso ali tão perto...

(...)
Como de planta as folhas renovadas
Mais frescas na hástea mostram-se, mais belas,
Puro saí das águas consagradas
Pronto a me alar às lúcidas estrelas.
A Divina Comédia, O Purgatório, Canto XXXIII.
Ilustração: Dante Purificado, de Salvador Dali

O João Maria



O João Maria, visitável aqui, é um daqueles casos que merece ser contado. 21 anos, pintor, neste momento com cataratas e portanto a precisar de ser operado aos olhos, tudo pareceria decorrer normalmente não fosse o caso da seguradora - a Médis, neste caso - informar que o seguro não cobre esta operação, pois o João tem um cromossoma, 21, a mais.
Há coisas que não têm explicação, pois não?

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Como nomear o desconhecido




«A nossa civilização está decadente, e a nossa língua – segundo este argumento – tem inevitavelmente de partilhar o colapso geral. Segue-se que qualquer luta contra os abusos de linguagem é um arcaísmo sentimental, tal como preferir velas à luz eléctrica ou cabriolés a aviões»

As palavras são de George Orwell, no seu ensaio A Política a e Língua Inglesa, publicado originalmente em 1946, mas cuja leitura me pareceu de algum modo actual.

Como falar sobre palavras sem significado, para as quais «(…) a pessoa que as usa tem a sua própria definição privada (…).»

Em dia de São Guilherme, esta leitura (mais do que abusiva do contexto original) fez-me lembrar outras palavras que usamos para realidades que não conhecemos. Como os Marcianos de outro Guilherme, por exemplo.

Enfim, devaneios linguísticos.

Aqui deixo a capa do livro do Orwell: vale a pena.

Selecção musical

Finalmente, mudo a música de fundo, para um dos meus músicos favoritos: Charlie Haden

Neste caso o CD - Charlie Haden Quartet West, com o tema Here's looking at you

terça-feira, 24 de junho de 2008

Heraclito

O segundo crepúsculo.
A noite que afunda no sonho.
A purificação e o esquecimento.
O primeiro crepúsculo.
A manhã que foi alba.
O dia que foi manhã.
O dia inumerável que será a tarde gasta.
O segundo crepúsculo.
Esse outro hábito do tempo, a noite.
A purificação e o esquecimento.
O primeiro crepúsculo…
A alba sigilosa e na alba o soçobro do grego.
Que trama é esta do será, do é e do foi?
Que rio é este pelo qual corre o Ganges?
Que rio é este cuja nascente é inconcebível?
Que rio é este que arrasta espadas e mitologias?
É inútil dormir.
Corre no sonho, no deserto, numa cave.
O rio que me arrebata e eu sou esse rio.
Fui feito de uma matéria desagregável, de misterioso tempo.
Talvez o manancial esteja em mim.
Talvez de minha sombra surjam, fatais e ilusórios, os dias.

Jorge Luís Borges

domingo, 22 de junho de 2008

Harmonia

Claustro de um convento católico, Lisboa, 2008
em fim de jantar, o ar enche-se de sonoridades portuguesas (guitarra portuguesa e guitolão), acompanhadas por suas congéneres orientais (clarinetes e percursão oriental), interpretadas por uma dança que terá um pouco de tudo.
onde sentimos que o diálogo inter-cultural também passa por nós.
a receita essa reverterá, como de costume, para as obras de restauro do convento, bem como para as férias das raparigas que ali vivem.
ali o mundo é melhor.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Porque é que parece sempre tão simples?

Não que eu alguma vez conseguisse...


terça-feira, 17 de junho de 2008

Conhecer os outros: os pilotos tokkotai



Como afirma Heidegger, nós estamos na história. Não que a história exista primeiro e nós entremos nela. No momento em que nascemos, estamos na história.
1 de Novembro de 1940


Dizem que todos os japoneses têm de trabalhar nas indústrias importantes para o esforço de guerra. Isso quer dizer que há quem esteja a sugar o doce néctar ignorando a luta, a dignidade humana, a humanidade dos japoneses. O que é o patriotismo? Que se entende por terra ancestral?
14 de Setembro de 1941

Não sei porquê mas não consigo sentir-me eufórico com as vitórias do Japão na guerra. Sinto ansiedade. Preocupa-me também o que irá acontecer ao capitalismo depois da guerra.
9 de Dezembro de 1941

Excertos do Diário de Sasaki Hachiro, piloto tokkotai, ou piloto suicida japonês, kamikaze, como ficaram conhecidos no Ocidente.


É o primeiro de um conjunto de seis que Emikho Ohnuki-Tierney, professora da Universidade de Wisconsin dá a conhecer, numa leitura "acompanhada" com a história destes pilotos, tantas vezes mal interpretada, e que é importante (acho eu) conhecer.

Sinto que tenho de aceitar o destino da minha geração, combater na guerra e morrer. Chamo-lhe o destino porque somos obrigados a ir para o campo de batalha para morrer sem podermos exprimir as nossas opiniões, criticar e analisar os pórs e contras das nossas questões e, agir com príncipios, isto é, depois de ser privado da minha própria força...
12 de outubro de 1941

A nossa única salvação, no entender do professor T. está em interiorizarmos que temos de morrer. Por outras palavras, não podemos pensar na morte como uma possibilidade de vida.
21 de Maio de 1943

Será mesmo que a história precisa dos invisíveis "portadores de sacrifício?"
1 de Janeiro de 1944


Excertos do Diário de Hayashi Tadao, piloto tokkotai
Uma leitura que não deixa de ser fazer com alguma inquietação, mas que é muito interessante. O meu estado de desconhecimento dos outros era, neste caso, completo. O que é um erro.

domingo, 15 de junho de 2008

A semana que se avizinha

Roubando a imagem à Gi, eis uma boa forma de passar a semana!

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Monstros Sagrados

ou a beleza da dança de Akram Khan, o qual poderia ter sido visto por terras lusas, por ocasião do Alkantara (poderia, porque tb não aproveitei)

terça-feira, 10 de junho de 2008

Concedido vos é saberdes...

Canto X: 142-144
142
«Até aqui, Portugueses, concedido
Vos é saberdes os futuros feitos
Que, pelo mar, que já deixais sabido,
Virão fazer barões de fortes peitos.
Agora, pois que tendes aprendido
Trabalhos que vos façam ser aceitos
Às eternas esposas e fermosas,
Que coroas vos tecem gloriosas,

143
«Podeis-vos embarcar, que tendes vento
E mar tranquilo, pera a pátria amada.»
Assi lhe disse; e logo movimento
Fazem da Ilha alegre e namorada.
Levam refresco e nobre mantimento;
Levam a companhia desejada
Das Ninfas, que hão-de ter eternamente,
Por mais tempo que o Sol o Mundo aquente.

144
Assi foram cortando o mar sereno,
Com vento sempre manso e nunca irado,
Até que houveram vista do terreno
Em que naceram, sempre desejado.
Entraram pela foz do Tejo ameno,
E a sua pátria e Rei temido e amado
O prémio e glória dão por que mandou,
E com títulos novos se ilustrou.


No Dia de Portugal, achei que estes versos, retirados dos Lusíadas, aqui ficavam bem.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Os Arquivos e as Memórias: O(s) Projecto(s) Bam, no Irão


A cidade de Bam, no Irão, se estão recordados, foi vítima de um violento terramoto que matou 30.000 pessoas, na manhã do dia 26 de Dezembro de 2003.

Se recordo aqui, agora, este trágico acontecimento, na primeira vez que se comemora o Dia Internacional dos Arquivos, passados que são 60 anos da criação do Conselho Internacional de Arquivos em Paris, no seio da UNESCO, é porque considerei que divulgar os dois projectos Bam que se desenvolveram em torno da salvaguarda das memórias fotográficas da cidade e dos seus habitantes constituiu uma dupla homenagem: aos arquivistas envolvidos nos projectos, mas sobretudo, aos ilustres anónimos (para nós) habitantes de Bam que podem assim manter e participar na elaboração das suas memórias (neste caso particular, fotográficas).

Se é certo que os Arquivos constituem a Memória de um Povo, de um País, não é menos certo que não existem sem que haja registos desse mesmo Povo…

Os Projectos Bam

- Depois do terramoto, e, quando lhes perguntavam “qual é o seu local favorito na cidade?” a maioria dos habitantes de Bam respondia: o cemitério. Quando se lhes perguntava porquê, respondiam simplesmente: “porque é onde as nossas memórias estão”.
De facto, 80% das famílias em Bam tinha perdido familiares no desastre, e a memória imediata estava irremediavelmente relacionada com a tragédia.

Foi assim desenvolvido um projecto único, criativo e inovador, pela Picture People, com a ONG Britânica Merlin e a ONG Suiça Terre des Hommes, dando a 100 homens, mulheres e crianças, máquinas fotográficas Kodak para que fotografassem a sua vida após o terramoto. Esta experiência produziu, como é natural, centenas de imagens e histórias, o que levou a que o projecto se tornasse anual, com o objectivo de se manter até 2010.

Simultaneamente, e sob a vontade de Parisa Damadan, desenvolveu-se o Bam Photographic Rescue Project, sustentado pela parceria com a AIDA Nedeerland, onde arquivistas holandeses asseguram a digitalização e controle de qualidade das imagens trazidas.
O objectivo deste projecto era (e é) salvar os espólios fotográficos das casas comerciais dos fotógrafos de Bam, existentes à data da tragédia. Salvar, portanto, um manancial de registos fotográficos dos habitantes de Bam que, de outra forma, não mais seria acessível para ninguém, nem para os próprios. Vale a pena visionar as imagens, que, de resto, não consegui copiar.
Bem como o pequeno filme feito por um realizador iraniano, logo após o terramoto, visionável mais abaixo.

No Dia Internacional dos Arquivos, é reconfortante acompanhar este caso.

Afinal, não há Arquivos sem Registos, sem Memórias, sem Pessoas.

three Days and ten days -

terça-feira, 3 de junho de 2008

Saramago e as histórias infantis

Através do Bruno Eiras, do Entre Estantes, eis uma dimensão de José Saramago pouco usual:

E se as histórias infantis fossem de leitura obrigatória para os adultos?
Seríamos realmente capazes de aprender o que há tanto tempo vimos a ensinar?

Aqui está um tema interessante, com um vídeo, narrado por Saramago (em espanhol), não menos interessante. Vale a pena o visionamento.

E, já agora, conseguem narrar ou aprender?

segunda-feira, 2 de junho de 2008

A Europa e o Futebol

Antevendo um mês em que não se falará de outra coisa que não o Europeu de futebol, aqui fica o registo de um futebol europeu alternativo, digamos assim, bastante mais cultural.

A ideia e o vídeo, esses retirei do blog da Pó dos Livros.

Os vencedores também não me espantam: afinal foi na Grécia que tudo começou…

domingo, 1 de junho de 2008

O (grande) Plátano de Portalegre


Plátano de Portalegre, 1888

Plátano (Platanus orientalis) : “árvore de folha caduca. Resistente aos fumos e condições adversas da atmosfera das cidades. Boa madeira de marcenaria. Árvore de grande porte e crescimento rápido.”

Assim a definem Francisco Caldeira Cabral e Gonçalo Ribeiro Telles no seu livro A Árvore em Portugal, que me lembrei de ir consultar após ter lido a notícia sobre as “obras “ de beneficiação dos suportes do plátano existente no Rossio de Portalegre que a Fundação de Serralves está a proceder.

Para mim não é uma árvore qualquer. Acontece que também já me sentei à sua sombra, já por ela passei várias vezes e, de facto, a dimensão daquela árvore e o espaço de socialização que acabou por se criar à volta do seu enorme tronco e da sua sombra em terra alentejana de (imenso) calor tornam-na num elemento vivo da cidade, na qual foi plantada em 1848…

Quantas memórias, quantas gentes já por lá passaram… também as minhas, de resto, as de meus avós, as de minha mãe.

Aqui fica, em imagens, uma breve “genealogia” do Plátano de Portalegre

S/d



Anos 40 (Séc. XX)

2007



2008

Imagens retiradas de:

Platano Revista (as mais antigas)

A de 2007 de aqui

A de 2008 de aqui